sábado, 15 de novembro de 2008

AO SOL

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Um grande sol claro e cadente,alaga a praça em júbilos africanos,e a sua catarata de fogo dá uma vibratilidade dolorosa às coisas que nos circundam,uma vida alucinada a cada simples função da nossa vida. Sob uma tal incandescência,que dirieis uma tripla essência da tortura,veiculada em fulgurantes zoeiras de arco-íris,adeus tranquilas sensações,ideias serenas,exactidões religiosas de sentidos,índoles mansas e amoráveis,almas translúcidas e benignos ideais de felicidade! Cada raio deste sol é uma pata de demónio agitando nos crânios todas as sortes de impulsões desencontradas,todas as monomanias mefistofélicas e bizarras....
Já as respirações sobem de ritmo,pressentindo o terrível acesso de calma do meio-dia. Trinta graus dentro de casa - ufa!,ufa! - ,o que quer dizer quarenta e cinco nos malhadouros das eiras. Uma lassidão começa a invadir os membros húmidos,e zuídos de enxame ziguezagueiam,
crepitam,ao redor dos nossos ouvidos. O vento que sopra é como o hálito dum forno crepitando de estalidos súbitos,que lembram os gritos de dor da terra ulcerada por milhões de cáusticos....

FIALHO DE ALMEIDA
O País das Uvas
Ao Sol
Círculo de Leitores
1981

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