quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

TEXTOS DE UM ACASO - 4

O acto chegara ao seu termo. Todos os bens,incluindo os da mulher,tinham ido na voragem. Ainda há bem pouco tempo o futuro lhe sorria,mas naquela altura,amarga altura,estava reduzido a nada. Não se contivera. Chorou lágrimas grossas,vindas dos fundos das entranhas. Ouviu-as o filho,uma criança aí de uns oito anos. Não as entendeu lá muito bem,no momento,mas ,mais tarde ,teve delas a real dimensão,vertendo-as,também,uma e mais vezes,que ocasiões não lhe faltaram.
Depois de uma maratona,que quase o arrasara,o filho recebeu dois prémios,cada qual o melhor,na forma de duas doenças graves,a dele próprio e a do pobre pai. Foi obrigado a esconder a sua,para acudir á outra,pois não havia mais ninguém de serviço. Sozinho,fazendo das tripas coração,acompanhou,dia a dia,a via sacra do pai,o costume,consultas,operação,internamento prolongado. Quase vacilou,mas lá cumpriu,mais morto que vivo,a sua missão. Pouco tempo,depois,encostou. Sozinho,sempre,a sua condição,lá se recompôs,mais ou menos,mas mais para o lado do menos,uma sorte,ainda,ou não,que podia lá ter ficado.
A mãe,coitada dela,lastimava-se,que mais não podia fazer,pois tinha lá também a sua carga,a sua conta,nada leve,como tantas,por esse mundo de contrastes gritantes,clamando aos céus,não se sabe bem porquê e para quê. O coração dela andava amarfanhado,dorido,muito dorido,como o de tantas mães,por esse mundo de interrogações e de interjeições. Merecia ela também um prémio. Entregaram-lhe,é certo,mas igualzinho ao calhado a muitas,um redondo nada. Tantas heroínas desconhecidas.

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