segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

BOMBO DE FESTA

Desgraças que estão sempre a acontecer quando se é o que se não pode deixar de ser. Fatalidade? Talvez sim,talvez não. Mas prossiga-se. Ele vivia apenas do seu humilde trabalho,numa época de apertar o cinto ainda mais do que era costume. E ele era muito,mesmo muito acanhado,se calhar por a calvice ter vindo para ficar,bem cedo,ainda mal deixara a juventude. Assim,desde muito cedo ,também,não largava o chapéu,para a encobrir. E os tempos em que lhe coubera andar por cá eram ainda muito atrasados.
Estava ele,pois,feito para vir a ser um rico bombo de festa,se acaso tivesse a pouca sorte de se cruzar com alguém que só gostasse de festejos. E quem havia de ser esse alguém? Pois foi precisamente o seu especialíssimo patrão. Ainda o pouparia se ele não tivesse mais nada,além de não ter cabelo. O azar foi esse,um azar dos grandes. É que a sua cultura ultrapassava,de longe,a do seu lindo patrão. E uma coisa destas o patrão não perdoava. Então,não querem lá ver,este pelintra,que de mim depende,a pretender saber mais do que eu? O atrevido,e não se sabe mais o quê. Mas eu vou-te mostrar que comigo não se brinca. E aproveitava todos os pretextos para o reduzir a pó.
E o pobre lastimava-se,quase chorava,junto dos amigos. Mas que mal lhe fiz eu? Sim,que mal? Ainda se não cumprisse,se mandriasse,ainda se compreende. Mas tenho o trabalho em dia,sou assíduo,o primeiro a chegar,e muitas vezes o último a sair. O que mais quer ele? Qualquer dia despede-me,é o mais certo,e, depois,o que é vou fazer? Sem padrinhos,fico para aí desempregado,e eu que não tenho mais nada a que me agarrar.
Tanto se lastimou,tanto viu a sua vida sem saídas,que acabou por adoecer de doença ruim. A sua pobre cabeça não suportou tanto amesquinhar,tanto se sentir um nada,que uma leve aragem empurraria para a valeta.

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